Em nome do Pai
Com passos precisos e respiração ofegante ela entrou na igreja pela porta lateral. Cabisbaixa, como se temesse se descoberta. Trazia contra o peito um pequeno pacote, embrulhado num simples coberto envolto por um xale branco. Ali estava a prova de seu "pecado", de sua fraqueza. Sentou-se na última fileira de bancos, o padre pronunciava: "Em nome do Pai..." Será que o Pai a perdoaria? Não tinha ela certeza de sua vocação? Não havia deixado para trás família e a pequena cidade por onde passava despercebida, para seguir seu chamado? Sua vocação religiosa? Era esposa de Cristo, e mesmo assim fraquejara. Nunca como naquele momento entendeu tão bem as palavras o Mestre, estava lá em Mateus livro 26, versículo 41: " Vigiem e orem,p para não caírem em tentação, porque o espírito está pronto, mas a carne é fraca." Sim, era verdade, depois e tantos anos de preparo, oração, jejum e isolamento do mundo, seu espírito era forte, sua devoção grande, mas a carne... A carne era fraca. E ela sucumbira aos desejos da carne, aos prazeres mundanos da carne. E ela ainda tremia por dentro só de lembrar os momentos íntimos, de volúpia. As mãos ásperas deslizando sobre seus quadris, o peso do corpo suado sobre o seu. "Em nome do Pai"... A voz do sacerdote ressoava em seus ouvidos como açoite, dilacerando não só sua carne pecaminosa, mas eu espírito que talvez não fosse tão forte assim. Depositou ali no banco o fruto de sua falta de vigilância e saiu como entrara. Caminhava agora com uma rapidez beirando o desespero; desespero de quem tem consciência do tamanho do seu erro e mesmo assim precisa fazê-lo. Tudo tinha sido acertado meses antes, o sumiço repentino, a carta enviada ao convento, será que acreditariam nela? Quem haveria de seqüestrar numa cidade como São Paulo uma freira? Mas agora era tarde, não queria sair da ordem, apesar da culpa sentia que ainda havia muito trabalho a ser feito naquela comunidade carente, tão necessitada de consolo. Ela também precisava de consolo, quem a consolaria? As lágrimas quentes escorriam face a baixo, não havia mais jeito, o único jeito era conviver com o suplício, dia após dia. Embarcou na estação Santa Cecília rumo a Itaquera. Só conseguia ouvir em seu interior a voz clerical: "Em nome do Pai..." Será que o Pai a perdoaria?
Fabiana Ferreira Lopes
Enviado por Fabiana Ferreira Lopes em 12/06/2009
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